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Pensando sem Palavras Por Shawna Halevy Você já pensou em como você pensa? Como isso acontece? Você pensa passo a passo, numa sequência lógica? Se você for escrever um pensamento, o que você escrever irá refletir como isso veio em sua mente? O produto final é o mesmo que o processo de pensar? Para sermos claro, nós não estamos falando de qualquer tipo de pensamentos, como impressões, uma memória, uma simples opinião ou preocupação, mas uma descoberta de princípios fundamentais; algo que você pode considerar uma idéia profunda e original. Se você for um professor, ou tentar comunicar uma idéia complexa, essas questões já se apresentaram a você naturalmente. Você achou que com esses estudantes ou outra audiência não poderia “simplesmente dizer isso” e esperar deles entender a idéia? Que explicar isso não os faz cada um pensar isso por si mesmos? O debate sobre o descobrir e comunicar idéias foi realizado em outro lugar nesse site[1]. Eu gostaria de adicionar a essa discussão uma questão simples: em qual forma seus pensamentos acontecem? Eles aparecem em palavras? Ou em outros tipos de objetos sensíveis? Um registrador de dados corre por sua mente? Ou isso é mais parecido com as cenas de um filme? Antes de seguir analisando por nós mesmos, vamos observar outra mente. Vamos perguntar a Einstein como ele pensa: “Nenhum homem realmente produtivo pensa na forma inscrita no papel. O modo como os dois conjuntos triplos de axiomas são contrastados no livro de Einstein e Infeld (“A Evolução da Física: do Conceito Inicial à Relatividade e ao Quanta”, por Einstein e Leopold Infeld) não é de nenhum modo como as coisas acontecem no processo atual de pensar. Isso foi apenas uma formulação posterior do assunto, somente uma questão de como a coisa poderia ser posteriormente escrita. Esses pensamentos não apareceram em nenhuma formulação verbal. De qualquer modo, eu muito raramente penso em palavras. Um pensamento vem, e depois eu posso tentar expressá-lo em palavras... Durante todos esses anos, existia um sentimento de direção, de ir diretamente para algo concreto. Com certeza, é muito difícil expressar esse sentimento em palavras; mas esse é definitivamente o caso, e claramente pode ser distinguido de considerações posteriores sobre a forma racional de solução”.[2] Em outro exemplo Einstein aborda a mesma questão: “As palavras ou a linguagem, assim como faladas ou escritas, não parecem desempenhar nenhum papel no mecanismo de meu pensamento. As entidades psicológicas que parecem servir como elementos do pensamento são certos sinais e imagens mais ou menos claras que podem ‘voluntariamente’ se reproduzir e se combinar. Esse jogo combinatório parece ser a característica fundamental do pensamento produtivo – antes de existir alguma conexão com a construção lógica em palavras ou outros tipos de sinais que podem ser comunicados aos outros. Os elementos acima mencionados são, no meu caso, visuais ou alguns de tipo muscular. Palavras convencionais e outros signos devem ser buscados laboriosamente apenas num estágio secundário, onde o mencionado jogo associativo está suficientemente estabilizado e pode ser reproduzido à vontade”.[3] E para resumir de modo mais sucinto, Einstein escreve: “Eu não tenho a menor dúvida de que nossos pensamentos passam a maior parte do tempo sem o uso de símbolos, e, além disso, em grande parte inconscientemente”.[4]
Se não palavras, o quê? Se Einstein não pensa em palavras, então, como ele pensa? Ele já deu a entender isso ao mostrar o processo de “jogar”, e a síntese voluntária ou combinação de pensamentos. A descoberta de uma nova idéia pode ser relacionada a uma surpresa, ao momento de “Eureca!”. Para conseguir isso, a imaginação não pode ser constrangida por questões ou caracterizações fixas, mas deve ser capaz de voar para além das sombras da experiência (os objetos que podem ser apontados e nomeados), para o não visto. Então, se não as palavras, por quais meios Einstein pensa? Ele incisivamente diz: “Eu freqüentemente penso em música”. O que quer dizer, pensar em termos de música? Ele tem acordes constantemente tocando em sua cabeça? Ele vê partituras em sua mente? “... quando nós nos comunicamos através de formas cujas conexões não são acessíveis à mente consciente, todavia nós a reconhecemos intuitivamente como algo significativo – assim nós estaremos fazendo arte[5]”. Isso pode indicar que a música é mais próxima ao processo subconsciente de pensamento do que qualquer outro sistema de linguagem, e, portanto, mais perto à parte mais ideal do pensamento. Isso faz sentido em relação ao que Einstein disse anteriormente, sobre esses pensamnetos serem dirigidos, puxados, como se do lado de fora, para a destinação correta. O mesmo acontece no desenrolar de uma bem composta peça musical. A música clássica boa é um reflexo da tensão e resolução que entra em luta com paradoxos. Por isso, Einstein poderia dizer: “Todo grande cientista é um artista”. Como um de seus biógrafos se expressou “[a música] era menos uma fuga do que uma conexão: à harmonia subjacente ao universo, ao gênio criativo dos grandes compositores, e a outras pessoas que se sentiram confortáveis ligando-se com mais do que com apenas palavras[6]” (ênfase adicionada). Outros irão concordar: para obtermos uma melhor idéia sobre o que é pensar em termos de música, como oposto às palavras, voltemo-nos para um contemporâneo de Einstein, o cientista russo V.I. Vernadsky: “A música parece para mim como a mais profunda expressão da consciência humana, porque ainda na poesia, na ciência, e na filosofia, onde nós estamos operando com conceitos lógicos e palavras, o Homem involuntariamente e sempre limita – e comumente distorce – aquilo que ele experimenta e entende. Dentro dos limites da afirmativa do poeta russo [Fyodor Ivanovich] Tyutchev de que ‘um pensamento, uma vez pronunciado, é falso’. Na música, nós mantemos os pensamentos impronunciáveis. Seria bastante interessante seguir de uma maneira concreta a influência óbvia da música no pensamento científico. Excita isso a inspiração?[7]”. É comum associar humores e sentimentos com certas harmonias ou chaves, por exemplo, uma chave menor com melancolia, mas o que discutimos aquí na música Clássica são de pensamentos que não podem ser expressos de outra maneira. Pensamentos tão profundos e eternos que eles estão fora da linguagem hodierna em cultura. Eles tanto precedem como superam o que podemos obter em uma conversação, colocando a música próxima às idéias inatas da alma.
‘Canções sem palavras’ Uma discussão mais explícita das palavras versus a música em expressar uma idéia verdadeira é tomada da composição de Felix Mendelssohn, “Canções sem palavras” – uma clara polêmica contra o rebaixamento da música como uma simples pintura tonal de cenas pastorais, ou como imitação de um poema sensual: “As pessoas freqüentemente criticam a música por ser ambígua, que suas idéias sobre determinado assunto parecem vagas, enquanto todos entendem as palavras; comigo é exatamente o contrário; não somente no que diz respeito a frases inteiras. mas também a palavras individuais; essas, também, parecem para mim tão ambíguas, tão vagas, tão ininteligíveis quando comparadas à música genuína, que preenche a alma com milhares de coisas melhores que palavras. O que a música que amo me expressa, não é um pensamento demasiado indefinido para ser expressado em palavras, mas, ao contrário, demasiado definido... Se você me perguntar qual é a minha idéia, eu digo – apenas a canção assim como ela se apresenta; e se eu tiver em minha mente um termo definido ou termos relativos a um ou mais dessas canções, eu não os revelarei a ninguém, porque as palavras de uma pessoa adquirem um significado totalmente diferente na mente de outra, porque a música dessa canção sozinha pode despertar as mesmas idéias e os mesmos sentimentos numa mente como na outra – um sentimento que não é, contudo, expresso pelas mesmas palavras[8]. As palavras têm muitos significados, mas a música podemos entre nós entender corretamente. Você irá aceitar isto como resposta à sua pergunta? Em todo caso, essa é a única que eu posso dar – embora elas são, afinal, só palavras ambíguas!”[9]. Isso me diz que existem pensamentos puros, pensamentos musicais, que não podem ser traduzidos em palavras. Esses são os mais próximos aos processos e pensamentos inconscientes. Felix diz que as pessoas que se queixam da música não são seguras em pensar em princípios que estão além da percepção sensorial. Eles seriam gratos se lhes dessem um manual para a vida que eles poderiam seguir, como se eles estivessem obedecendo ao sinal de estacionamento. Mas, poderiam essas pessoas se desenvolver mentalmente o suficiente para entender algo como a gravidade universal, que não pode ser sentida diretamente, nem ser descrita (em termos do que causa seus efeitos) por equações ou definições básicas, e que não existe como objeto, mas é ainda mais real e poderoso? Poderá alguém nesse estado ou com essa capacidade ser capaz de entender algo efêmero como o amor? Eles perderiam o significado de ambos esses conceitos ao olhá-los no dicionário, embora eles não possam negar sua existência e influência.
Furtwängler Defende Beethoven O mesmo Richard Wagner que atacou Mendelssohn como um músico judeu que corrompeu a música romântica alemã com o intelecto, criticou a Nona Sinfonia de Beethoven ao dizer que a música não se equipara às palavras. Wilhelm Furtwängler, o maior maestro do século XX, defende Beethoven da “falácia que resulta da tentativa de registrar racionalmente a idéia em palavras – uma tarefa que é, claro, impossível sem sacrificar a substância da idéia de uma maneira consideravelmente extensa... Beethoven, mais do que qualquer outro, tinha um impulso a expressar tudo numa forma puramente musical. O músico dentro dele se sentia inibida, não inspirada, por um texto. Ele não permitia a forma textual de uma palavra ditar a ele qual forma sua música deveria tomar. Assim, Beethoven se torna completamente ele mesmo quando livre para seguir exclusivamente as demandas inerentes da música[10]”. Nós devemos reconhecer que o desejo de Beethoven de ser livre de qualquer “forma textual de uma palavra”, e de viver do pensamento musical, é similar ao conceito de Einstein de jogo e de pensamento inconsciente. Disso nós podemos intuir que a música não é limitada a uma expressão das idéias imaginativas, mas é verdadeiramente a criação do homem para modelar o maior, mais produtivo e orgânico processo de pensamento; para sermos mais consciente disso, e termos mais poder para manejar isso. Johannes Kepler descobriu que a harmonia musical usada pelo homem para externar sua mente criativa, é também encontrada na forma de sombra, no Sistema Solar, como expressão criativa da mente de Deus. Talvez o sistema bem-temperado como conhecido hoje em dia, é o melhor para comunicar idéias genuínas porque é a reflexão de, e é limitado por, princípios físicos e leis, ao invés de simples palavras. Pode-se dizer que a música clássica é o mais próximo que o "subjetivo" chega ao “objetivo”. O pensamento e a expressão humanas, como Einstein notou, podem ser expressadas como o ser e o devir. Nós começamos com o absoluto vivente, um ideal – podemos dizer, uma descoberta – e depois tentar comunicar isso pela montagem de peças que mais se aproximem da representação da nossa idéia. Na ciência física se apresenta a nós primeiro a sombra (a observação de uma experiência ou alguma outra evidência, as partes ou o porvir), e temos que trabalhar em ordem inversa para conhecer a idéia que gerou isso. “Assim, não é mais surpreendente que o Homem, imitando seu Criador, por fim encontrou o método de cantar em harmonia que era desconhecido dos antigos, de modo que ele possa jogar, por assim dizer, a perpetuidade da totalidade do tempo cósmico em algumas fracções breves de uma hora, pelo concerto artificial de muitas vozes, e saborear até certo ponto, a satisfação que Deus seu Criador em Seus trabalhos sentiu por um mais delicioso senso de prazer nessa imitadora de Deus, a Música” – Kepler, Harmonice Mundi. Para concluir (se isso pode ser feito em palavras): A verdadeira imaginação científica é (pelo menos) não-verbal. No intuito de livrar nossas mentes do pensamento literal, devemos nos perguntar: A forma como a língua é usada atualmente limita nossos pensamentos? Deixamos um teleprompter interno nos dizer o que pensamos? Nós entendemos que a linguagem é útil e necessária para explicar coisas aos outros, mas é ela suficiente? É ela suficiente para o verdadeiro pensar elevado? Nós vimos com Einstein que o segredo da ciência é ir além da linguagem. O segredo que a humanidade desenvolveu para pensar o que pensamos é a música clássica. Nós usamos a música como modelo para o pensamento puro; como ferramenta para a criatividade intencionada, permitindo reflexão e melhoria do nosso pensamento. Isso me deixa com a pergunta: O pensamento não é apenas não-verbal, mas é igualmente não-visual? O pensamento é inteiramente não-sensual? http://portugues.larouchepub.com Para informação, perguntas ou comentários, por favor escreva para preguntas@larouchepub.com [1] http://www.larouchepac.com/node/21237 [1] e http://www.larouchepac.com/metaphor-intermezzo [2] e http://www.larouchepac.com/node/21206 [3]. [2] Wertheimer, “Productive Thinking.” [3] Jacques Hadamard, The Psychology of Invention in the Mathematical Field, 1944, Appendix II, “A Testimonial from Professor Einstein.” [4] Albert Einstein, Autobiographical Notes, 1946. [5] Einstein, “The common element in artistic and scientific experience,” Menschen, Fevereiro de 1921. [6] Walter Isaacson, Einstein, His Life and Universe, 2007. [7] V.I. Vernadsky, “Thoughts and Sketches: Les musiciens ne font que commencer a connaître la jouissance du sens historique” [Os músicos estão apenas começando a entender o prazer do sentido histórico]; W. Landowska, Musique ancienne, traduzido por Bill Jones. A questão de Vernadsky foi abordada numa postagem registrada em www.larouchepac.com por este autor. [8] Goethe também disse, na quarta parte de “Dichtung und Wahrheit”, “Eu já vi muito claramente que nenhuma pessoa entende a outra; que ninguém recebe a mesma impressão como outros das mesmas palavras”. [9] Felix Mendelssohn Bertholdy para Marc-André Souchay, Lübeck. Souchay perguntou a Mendelssohn os significados de algumas de suas “Canções sem palavras”. Berlin, 15 de Outubro de 1842. William Empson, autor de Seven Types of Ambiguity, concordaria, apesar de considerar a linguagem uma ferramenta, em vez de um obstáculo para expressar idéias. [10] Wilhelm Furtwängler, “Concerning Music,” 1953. Isso não é para dizer que Beethoven não era inspirado pela poesia, mas apenas para enfatizar que Beethoven era superior a alguém como Wagner, porque ele não estava trabalhando com enredos, o que pode ser chamado de “músicas de programa”, ou mais recentemente, músicas de filme. Uma discussão mais completa da diferença entre uma idéia em prosa sendo a soma das palavras usada, vs poesia, sendo um efeito não linear por fora das palavras e também usando meios totalmente legais, terá que ser realizada em outro lugar; mas pode ser encontrada em parte nos trabalhos do site acima referendado, e também nos trabalhos de Shelley, Keats, Shakespeare e Schiller. Deve ser tão provocante perguntar se você pensa poeticamente, quanto se você pensa musicalmente, como oposto ao pensamento em meras palavras. Aquí está um extrato para qualquer um interessado em tentar dar sentido à citação de Wagner em seu ensaio “Beethoven”: “Não são os pensamentos expressos nos versos de Schiller que ocupam nossas mentes posteriormente, mas o som familier do canto em coral; no qual nós mesmos somos convidados a participar... De fato, é óbvio, especialmente com a melodia principal mesma, que as palavras de Schiller são construidas arbitrariamente e sem grande habilidade; porque essa melodia primeiro desvele sua amplitude diante de nós como uma entidade per si, confiadas aos intrumentos sozinhos...”
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